Areia do tempo
Não ouviu a voz ao redor.
Não sentiu o pulsar no peito.
Caminhando por entre sombras
ele estava.
Livre de toda a dor que um dia
carregou consigo.
Distante de tudo, olhou para
dentro de si.
Encontrou resquícios de
inocência,
Restos de confiança,
Retalhos de saudade.
Nas mãos, impressas na carne,
memórias que não pode apagar.
Irá levar para aonde for.
Como troféus.
Conquistas de uma vida de
derrotas e vitórias.
De lágrimas e sorrisos
sobrepostos.
Foi barqueiro de sua jornada.
Origem, caminho e destino da
travessia.
Foi passo na estrada, vela ao
mar.
Linha reta por entre curvas
livres.
Os amores que teve,
Os lábios,
Os corpos,
Os olhares,
Eram ele.
Estavam em sua pele e ossos.
Estavam em seu sangue e
músculos.
Estavam em suas células.
Em cada uma de suas células.
Não se despediu quando foi embora.
Não disse “adeus” nem “olá”.
Não havia início.
E não havia fim.
Sentiu saudade dos dias que
não viveria mais.
O ponteiro correu.
O vento soprou.
A janela bateu.
A vida passou.
Por entre os dedos.
Feito areia
Do tempo
Que não volta mais.