E se os próximos 30 dias fossem os últimos da sua vida? O que você faria? O que você diria? Para quem você diria?
Pensei nisso. E pensei muito nisso. Fiquei um tempo exageradamente grande pensando nisso. Não é fácil pensar nisso quando se pensa seriamente nisso. Pensar nisso é pensar na morte, mas, pensar nisso, é, sobretudo, pensar na vida. E isso é muito difícil. Doloroso até.
Se os próximos 30 dias fossem os últimos da minha vida (e eu soubesse disso), eu iria agradecer a todas as pessoas que foram e são parte importante dos meus dias; eu iria dar os meus livros e cds e todas as coisas das quais eu mais gosto para as pessoas as quais eu mais gosto; eu queimaria as minhas calças e só usaria bermudas; eu diria a todas as pessoas com as quais me relaciono o que sinto por elas; eu compilaria em um único meio tudo o que, querendo escrever, eu escrevi em diversos lugares e deixaria para a minha mãe; eu faria uma fogueira com o meu computador e dançaria ao redor dela.
Se os próximos 30 dias fossem os últimos da minha vida, eu iria ao Sul da Bahia, ah..., certo que eu iria e levaria livros nas mãos; eu diria aos meus irmãos que, apesar de, às vezes, sentir vontade de matá-los, em qualquer momento, eu mataria por eles; eu subiria na minha moto e sairia por aí, pegaria a estrada e iria parar onde me desse na telha, andaria e conheceria lugares e conheceria pessoas e experimentaria sensações e sorriria e faria sorrir e choraria e faria chorar.
Se os próximos 30 dias fossem os últimos da minha vida, eu tentaria vivê-los do modo mais humano, emocional e instintivo possível, despreocupado com as conveniências, despreocupado com a razão; eu saltaria de para-quedas, eu voaria de asa delta; eu me aproximaria de quem quero me aproximar (e iria aonde fosse preciso para isso).
Se os próximos 30 dias fossem os últimos da minha vida, eu destruiria todos os relógios; eu não me preocuparia nem um pouco com o tempo, eu faria o meu tempo passar lento quando eu assim quisesse e rápido quando tivesse vontade; eu ficaria a maior parte possível dos dias sem um teto sobre a minha cabeça, eu ficaria na rua, caminhando, olhando, falando, ouvindo.
Se os próximos 30 dias fossem os últimos da minha vida, eu não buscaria respostas. Para que elas me serviriam? O único motivo de se viver é não saber o que está atrás da próxima porta. Eu iria a um jogo do Grêmio com o meu pai e faria daqueles minutos uma eternidade e, depois, iria pescar com ele, passando a noite sob as estrelas ouvindo-o contar suas histórias.
Se os próximos 30 dias fossem os últimos da minha vida, eu os viveria com paixão. Eu viveria uma paixão. Eu me apaixonaria. A cada dia uma paixão nova. Eu não odiaria, se os próximos 30 dias fossem os últimos da minha vida.
Se os próximos 30 dias fossem os últimos da minha vida, eu faria tudo isso nos primeiros 29. No último, no trigésimo dia, eu sumiria. No trigésimo dia eu iria para um lugar em que ninguém, mas ninguém mesmo, pudesse me encontrar. Eu não gostaria que ninguém me visse nos instantes finais, eu não gostaria que ninguém chorasse por mim, eu não gostaria que ninguém sentisse pena de mim; eu gostaria que meus amigos lembrassem de mim enquanto tomassem um chopp em uma mesa de bar; eu gostaria que meus pais e irmãos almoçassem juntos e fizessem um brinde para mim, rindo das bobagens que falei; eu gostaria que alguém lesse algo que lhe escrevi, pensasse em mim e desse um sorriso (uma gargalhada seria ainda melhor). Passadas as 23 horas iniciais do trigésimo dia, eu deitaria em um relvado e ficaria olhando as estrelas. Eu ficaria olhando para o céu, pensando em tudo o que eu fiz e em tudo o que deixei de fazer. Pensando em tudo o que eu disse e em tudo o que deixei de dizer, em tudo o que senti e em tudo o que deixei de sentir. Eu ficaria ali, imóvel, sereno, pacientemente, esperando a inevitável chegar, pegar na minha mão e me levar. Eu iria satisfeito. Eu iria feliz, se assim fossem os últimos 30 dias da minha vida.
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