Elíseos
Eu queria ouvir uma sinfonia de flautas e harpas enquanto
caminhava sem pressa pelos campos floridos dos Elíseos. Eu estaria cercado por
borboletas coloridas e pássaros cantantes me despertariam em todas as manhãs.
Um perfume agridoce tomaria o ar. Na boca, levaria para sempre o gosto dos
lábios dela.
Eu queria cantar a eternidade dos momentos bons, sorrir sem
motivos, deixar correr por entre os dedos as águas cristalinas que brotam da
terra cheia de vida. Por todos os lugares, em todos os momentos, eu seria
aquele que sempre fui, mas seria diferente. A cada amanhecer, eu seria
diferente, feito uma aquarela em construção pelas mãos do artista. As cores
explodindo em harmonia e caos, formando sonhos lúcidos diante dos meus olhos.
Ela estaria neles. Ela sempre estaria neles. Viva. Calor a aquecer minhas
noites, presença a iluminar meus dias.
Eu queria dançar sob as estrelas de um infinito céu azul. No
chão, meus passos contariam nossa história, seriam letra e canção da música que
escrevi para nós dois. Seria carne, seria espírito, seria toque e memória, lembrança
e saudade. Não haveria medo, não haveria certezas. Tudo seria uma descoberta,
uma permanente descoberta. Dentro de mim, amor. A transbordar, feito chuva de
verão sobre a pele quente.
Eu queria ser a poesia do olhar, queria ser a alma livre dos
que sentem sem limites. Sem ter para onde ir, apenas iria. Até aonde quisesse,
até aonde pudesse, até o fim do mundo, até o início de tudo. Barco a vela,
avião de papel. Sinos ao longe, mãos dadas. Um universo ao alcance do toque,
uma viagem ao interior de mim. Uma jornada para perto dela.
Eu queria que fosse assim. Simples assim. A felicidade de um
amor tranquilo. A tranquilidade de uma paz perene. Nada mais. Que a vida seja
doce e que a morte traga consigo a leveza de um fim sereno. Eu queria que fosse
assim. Eu queria que fosse.
Mas, se assim não for, se não for feito um flanar por entre
as nuvens, se não for feito relâmpago, não for feito trovão, que seja como
tiver de ser. Que seja real, que seja duro. Que seja doloroso, até. Que seja
perigoso, que seja cheio de tropeços. Que seja amargo. Que seja quente, que
seja elétrico. Mas que seja calmo também. Que seja uma manhã de domingo, que
seja um passeio no parque, que seja um sussurro no ouvido. Que seja um aceno ao
futuro, que seja um lugar do passado. Que seja palavra riscada na areia, que
seja onda do mar. Que seja amar.
Que seja vivo.
Que seja vida.
Que seja verso.
Que seja horizonte.
Que seja utopia.
Que seja travessia.
Que seja sutil.
Que seja humano.
Que seja singela.
Que seja eu.
Que seja nós.
Que seja ela.
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